sábado, 21 de maio de 2011

Os Antepassados de Luiza Ferraz Ribeiro da Luz (5 partes)

Minha avó Luiza Ferraz Ribeiro da Luz faleceu em 2006. Aqui prestam homenagem a ela as vozes tênues de seus ancestrais, cujo espírito procuro lembrar.

Perduramos em espírito enquanto resta a nossa memória.

Em cinco partes.


quinta-feira, 19 de maio de 2011

O Verdadeiro Fim do Mundo: A América do Sul no Contexto do Povoamento Global




 

 








Este artigo publiquei originalmente em 2005 na Revista "O Carste", do Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas (GBPE),depois de meus estudos de antropologia biológica na USP. Desde então, novas descobertas e novas pesquisas na área tornaram esse campo ainda mais fascinante!

Por Pedro Lobo Martins

1- Introdução
     O gênero Homo surgiu na África, subsequentemente deixando este continente para colonizar a Eurásia, a Austrália e, por fim, as Américas. Embora a profundidade temporal envolvida no povoamento global seja ainda muito discutida, bastante se tem, nas últimas décadas, estreitado os limites cronológicos envolvidos. Alguns arqueólogos acreditam que os humanos possam ter entrado na América tão cedo quanto 200.000–150.000 anos antes do presente (AP), durante períodos glaciais mais antigos, em que uma conexão terrestre entre a Sibéria e o Alaska (Beríngea) ter-se-ia constituído; outros sustentam a possibilidade de migrações transoceânicas através do Pacífico e mesmo do Atlântico1. Entretanto, uma entrada via Beríngea entre 18.000 e 12.000 AP situa-se dentro dos limites temporais e geográficos que a maior parte dos arqueólogos e paleoantropólogos, no estado do conhecimento atual, está disposta a aceitar.
     Até os dias de hoje (2005) não se encontraram nas Américas esqueletos humanos mais antigos que 12.000 AP, o que sugere que as primeiras migrações em direção às Américas tenham ocorrido no final da Glaciação de Wisconsin. As culturas paleoíndias norte-americanas parecem iniciar-se com Clovis e Folsom, datadas entre ~11.200-10.500 AP e entre ~10.900 a 10.200 AP, respectivamente, terminando no início do Holoceno, em ~8.500AP. Estas culturas caracterizam-se por líticos bifaciais com caneluras, bem trabalhados, associados a ossos de fauna extinta. Por isso são consideradas adaptações a habitats terrestres, especializações à caça de megafauna.
     Culturas menos especializadas, muitas delas contemporâneas a Clovis/Folsom, entretanto, acabaram por desbancar suas primas norte-americanas, imprimindo, como veremos, a tônica cultural que acabou por prevalecer. As costas Pleistocênicas, hoje em grande parte submersas, não têm sido alvo de investigação sistemática. Por outro lado, as florestas tropicais foram, durante muito tempo, consideradas barreiras ecológicas à ocupação paleoíndia devido à suposta escassez dos recursos necessários à subsistência humana. Imaginava-se que somente o advento do cultivo de roças tivesse possibilitado essa ocupação. Contudo, pesquisas recentes2 mostraram conclusivamente a presença paleoíndia na Amazônia, iniciando uma nova era nas discussões sobre o povoamento das Américas.
            Este artigo pretende, à luz de diversas contribuições para o assunto, apresentar um modelo heurístico para os eventos que antecederam a ocupação paleoíndia das Américas, particularmente a do sul, no contexto geral do surgimento e da dispersão do homem anatomicamente moderno (HAM) pelo planeta.

2- As Origens do Homem Anatomicamente Moderno (HAM)

2.1 O gênero Homo
As origens do gênero Homo estão situadas no Plioceno africano, por volta de dois milhões de anos atrás. O gênero é representado, nessa época, por fósseis referenciados a H. habilis, com considerável variabilidade de tamanho e de forma, caracterizados por uma capacidade craniana (500-800cm3) bem maior do que a de seus ancestrais australopitecíneos.
No início do Pleistoceno, há 1,8 milhão de anos, aparecem os primeiros fósseis de Homo ergaster, na África. Uma rápida dispersão dessa espécie para a Eurásia ficou patente em depósitos como Dmanisi, na Geórgia (1,75 milhão de anos) e ‘Ubeidyia, em Israel, onde material atribuído a H. ergaster foi encontrado associado a uma indústria lítica de características semelhantes à Olduvaiense, ou Modo Técnico I, representada por seixos toscamente lascados (foto abaixo).


Em algum lugar da Eurásia Homo ergaster deu origem a Homo erectus (alguns autores preferem considerá-los como pertencentes a uma mesma espécie), que ampliou significativamente sua distribuição nesse continente, tendo perdurado aí certamente até cerca de trezentos mil anos atrás, embora se admitam ocorrências ainda mais tardias em Ngandong, Java, mas particularmente em Flores, na Indonésia. Nesta última localidade, material esqueletal subfossilizado de uma nova espécie humana (H. floresiensis), que pode ter perdurado até cerca de 13.000 AP, foi descoberto em 2003 em uma caverna3 .Admite-se que a especiação alopátrica (isolamento geográfico), a partir de precursores erectus, tenha dado origem a esta forma insular miniaturizada, com apenas cerca de 1m de altura.
Mas é a África que se revelou o verdadeiro berço da humanidade. É nesse continente que se observam, de modo mais evidente, formas arcaicas diversificadas, transicionais entre Homo ergaster e o Homo sapiens moderno. Sítios como Elandsfontein, Broken Hill (Kabwe) e Bodo, datados entre 400.000 e 200.000 anos atrás, são exemplos. Alguns cientistas agrupam essas formas arcaicas sob a denominação H. heidelbergensis, cujo espécime-tipo é uma mandíbula encontrada em 1907 na jazida de Mauer, na Alemanha. Outros autores preferem atribuí-las a uma outra denominação específica: H. antecessor. Esses humanos arcaicos foram encontrados, ainda que de forma esparsa, em todo o velho mundo. Populações de H.antecessor, ou de H. heidelbergensis, teriam deixado a África no Pleistoceno Inferior, entre 1.000.000 e 800.000 anos atrás, em direção à Europa, onde teriam evoluído em certo isolamento até H. neanderthalensis ( fotos abaixo).







2.2 Surgem os modernos
Se caracteristicas modernas incipientes começaram a ser vislumbradas já em formas transicionais arcaicas, é somente a partir de 200.000 AP que surgem, na África, os primeiros crânios com características eminentemente modernas: queixo bem definido, abóbada craniana arredondada, maior capacidade craniana, arcos superciliares menos conspícuos ou ausentes, dentes menores e um físico menos robusto. As datações mais antigas para material esqueletal de HAM, entre 70.000 e 120.000 AP, provêm de cavernas da costa da África do Sul e da Etiópia. Os materiais de Omo Kibish, Florisbad, Jebel Irhoud e Border Cave, entre outros, também exibem estas características modernas, ainda que de forma incipiente.
  Muitas teorias científicas relativas às origens do homem moderno foram propostas. Em um dos extremos está a Teoria da Evolução Multirregional, que admite que os humanos modernos tenham evoluído de forma mais ou menos simultânea a partir de formas arcaicas resultantes da evolução de populações semi-isoladas de erectus, em diferentes partes do planeta4. Fluxo gênico constante, ainda que limitado, teria impedido o surgimento de novas espécies e permitido que todas as populações regionais atingissem o limiar da modernidade em uma quase-sincronia. A Teoria Out of Africa ocupa o outro extremo, e sugere que os humanos modernos tenham surgido em uma região particular, especificamente a África e, a partir de cerca de 100.000 AP, substituído geneticamente as populações arcaicas dos outros continentes, que teriam sido varridas para sempre do palco evolutivo onde até então haviam contado a sua história.

Se esta última teoria ganhou espaço na última década, graças a novas evidências oriundas do registro fóssil mas, sobretudo, da genética molecular, teorias intermediárias5,6 talvez venham a se revelar mais consistentes. Vislumbra-se, assim, um panorama evolutivo caracterizado por intenso intercâmbio genético entre populações africanas e da Eurásia desde pelo menos 500.000 AP, e talvez mais. Contudo, pulsos de expansão a partir da África, o mais recente deles há cerca de 70.000 anos, contribuíram com a maior parte do pool gênico das populações atuais, em todo o mundo. Templeton6 calcula que 90% das árvores de haplótipos do genoma nuclear estejam enraizadas na África. É significativo que esta última grande diáspora africana suceda um gargalo caracterizado por uma drástica redução da população moderna mundial, determinada aparentemente por um evento vulcânico (Toba) na Indonésia, de grandes proporções e de repercussões globais 7, mas também com a disseminação, por todo o mundo, de uma mente mais criativa e simbólica. Na verdade, esta “explosão cognitiva” talvez se deva, em instância principal, a pressões evolutivas já existentes e postas rapidamente em curso por aquele evento catastrófico, ocorrido há cerca de 73000 anos (foto abaixo).



2.3 As Grandes Diásporas
            O modelo mais detalhado e mais bem estruturado para a origem e dispersão dos humanos modernos é o Modelo das Múltiplas Dispersões, proposto por Lahr & Foley. Este modelo propõe que a primeira dispersão de HAM tenha se dado através da Península do Sinai para o Levante. Os representantes humanos extremamente diversos do oriente médio, datados dessa época, (Skhūl, Qafzeh), podem fazer parte de um influxo da comunidade biótica afro-arábica durante o período interglacial quente e úmido que caracterizou o estágio isotópico 5, entre ~130.000 e ~74.000 AP. A permanência dos modernos no Levante, entretanto, foi precária. Portando uma tecnologia do Paleolítico Médio, foram substituídos ou deslocados por populações Neandertais nos períodos mais frios. A primeira incursão para fora da África falhou.
Entretanto, novos eventos migratórios para fora da África ocorreram entre 75.000 e 45.000 AP, dividindo as populações modernas em dois grupos genéricos: australasiático e eurasiático8. O grupo australasiático partiu primeiro, passando pela Península Arábica e prosseguindo pelos atuais Iraque, Irã, e pela costa do Paquistão e da Índia até atingir a Austrália entre 60.000 e 40.000 AP. Por sua vez, as populações eurasiáticas modernas tiveram sua origem em um evento de dispersão com início mais tardio, por volta de 45.000 AP. Passando possivelmente pela Península do Sinai e pelo Levante, ou tendo esta região como ponto de partida, terminaram por ocupar a Europa e o Norte da Ásia8.
Portando uma tecnologia mais avançada, do Paleolítico Superior, os HAM substituíram, no processo de dispersão, a grande maioria das populações humanas arcaicas, embora algum grau de intercâmbio genético possa haver ocorrido, com a formação de zonas de hibridização. A possibilidade de que algumas características genotípicas encontradas em populações não africanas remetam a ancestrais arcaicos deve, portanto, ser considerada5 .
Essa fenomenal dispersão parece haver sido possibilitada pela explosão cognitiva sem precedentes, de que já se falou, com base em mudanças cerebrais que teriam levado a uma maior habilidade verbal. Aonde quer que os HAM envolvidos na colonização da Australásia e da Eurásia tenham ido, levaram consigo as capacidades para a arte e para o simbolismo, para a inovação tecnológica e para a solução de problemas complexos. Novas tecnologias incluíram as primeiras lâminas delgadas de pedra, microlíticos, trabalhos em osso e conchas, ornamentos e projéteis mais elaborados. Apareceram ainda rituais mais complexos, a pesca intensiva e, de modo significativo, as primeiras embarcações capazes de propiciar viagens marítimas.

2.3.1 Os Australasiáticos
As populações australasiáticas, hoje restritas geograficamente ao sudeste asiático, ocuparam uma área muito mais ampla no passado. Crânios como os de Liujiang, datados em  cerca de 67.000 AP, e os encontrados nas câmaras superiores da caverna de Zhoukoudian, no noroeste da China (11.000-18.000 AP), não apresentam afinidades mongolóides. Parecem, por outro lado, representar remanescentes de uma expansão pericosteira de populações australasiáticas, das quais os Ainu do Japão seriam um exemplo atual9. Esta expansão, como se verá, pode ter incluído as Américas e culminou com a formidável expansão marítima, começando 3.600 anos atrás, da cultura Lapita pela Polinésia, provavelmente a partir de Taiwan8.

2.3.2 Os Eurasiáticos
Os HAM chegaram à Europa quando esta se preparava para o máximo glacial. Isto pode ter sido possível graças aos avanços tecnológicos do Paleolítico Superior, com as inovações do Aurinhacense10.
Os assim chamados cro-magnons, responsáveis pela sua introdução na Europa, legaram-nos o melhor registro do repertório tecnológico e cultural do final do último período glacial. Ocupando a pátria Neandertal, era inevitável que os cro-magnons interferissem de maneira decisiva na vida de seus parentes evolutivos: há cerca de 27.000 anos os últimos Neandertais, que sobreviviam no fundo-de-saco que é a Ibéria, deram um último vislumbre em suas plagas ancestrais antes de sucumbir às vicissitudes daqueles tempos11 (a foto abaixo é das cavernas de Gibraltar, onde se encontraram os esqueletos neandertais mais recentes, com cerca de 28.000 anos).


 Na Ásia Central, nas chamadas Estepes dos Mamutes, o ramo oriental dos povos de origem eurasiática adquiriram características adaptativas ao clima seco e frio, que resultaram em um complexo fenotípico que associamos aos povos mongolóides (cabelos espessos e lisos, pregas epicânticas, achatamento nasal, pilosidade escassa, gordura subcutânea abundante, saliência zigomática e  braquicefalia, entre outros). Essas características propiciaram uma longa história de dispersão e sucesso. De sua origem há talvez 25.000 ou 15.000 anos, os Mongolóides invadiram o sudeste da Ásia, previamente habitado por populações australasiáticas, as quais foram repelidas ou absorvidas. Isso ocorreu provavelmente no final do Pleistoceno12. Assim pode ter sido formado o heterogêneo grupo de pessoas a que se chamam paleomongolóides: filipinos, polinésios, vietnamitas etc. Após a desintegração da Estepe dos Mamutes, a partir de cerca de 18.000 AP, as florestas estenderam-se mais para o norte, e com elas seguiram os Mongolóides do norte, ou Neomongolóides13,14. As evidências lingüísticas, morfológicas e genéticas corroboram os registros arqueológicos, mostrando que houve uma enorme expansão mongolóide para a Sibéria, Alaska e, finalmente, para o Novo Mundo a partir de cerca de 13.000 anos atrás 15

3- O Homem chega ao Novo Mundo    
   
3.1 A colonização da Sibéria
Quase todos os cientistas envolvidos nas questões do povoamento das Américas concordam que a origem dos americanos reside na Sibéria e no Nordeste da Ásia. Os registros arqueológicos dessa vasta região são, portanto, de importância fundamental. O sítio de Ma’lta, localizado às margens do Rio Angara, ao norte da cidade de Irkutsk, sintetiza a cultura Paleolítica Superior da Sibéria meridional, sendo caracterizado por moradias semi-subterrâneas repletas de artefatos, obras de arte, estatuetas e um sepultamento. Outros sítios da região mostram a dispersão dos HAM para a Estepe dos Mamutes sub-ártica da Sibéria central (abaixo de cerca de 55o de latitude norte) por volta de 23.000 a 20.000 AP12.
Entretanto, com a chegada das condições extremas do máximo glacial, por volta de 19.000-18.000 AP, as populações siberianas decaíram bastante em número, sobrevivendo apenas em refúgios no Yenisei meridional e na região Transbaikal. Talvez a ausência de madeira e de outros combustíveis tenha sido o fator ambiental determinante dessa virtual ausência humana. A partir de 18.000 anos atrás as condições climáticas voltaram a melhorar, a madeira combustível voltou a estar disponível e a densidade de sítios Paleolíticos aumentou. Estes são caracterizados sobretudo por uma indústria de microlâminas, que são encontradas dos Urais ao Pacífico e da Mongólia interior ao Ártico. Tais sítios representam acampamentos de curta duração ocupados por grupos forrageiros com grande mobilidade. Restos humanos são raríssimos, mas o sítio de Afontova Gora-2 forneceu um fragmento craniano com características mongolóides16 .
As populações humanas seguiram de perto o reflorestamento da Sibéria. As microlâminas aparecem na região do lago Baikal por volta de 18.000 AP. As bacias do Yenisei, do Ob’ e do Lena são colonizadas entre 16.000 e 14.000 AP; o Ártico, por fim, é atingido por volta de 13.000 AP.

3.2 A um passo da América
Atualmente os mais antigos sítios na Beríngea (como se chamam as terras eventualmente emersas do estreito de Bering e áreas contíguas) datam de entre 14.000 e 11.000 AP. Na Beríngea Ocidental conhecem-se os sítios de Ushki e Berelehk, datados entre 14.000 e 12.000 AP; na Beríngea oriental os registros arqueológicos são representados pelo complexo Nenana, datado de entre 11.800 e 10.700 AP. Nenana é atualmente a mais antiga cultura americana com datações radiocarbônicas seguras, preenchendo os critérios de validade universais estabelecidos para sítios paleoíndios.Todas as culturas da Beríngea são caracterizadas por tecnologias contendo lâminas e bifaces, mas também pela falta de microlâminas e de líticos do tipo Clovis.
Parece claro que o povoamento da Beríngea e da América foi um produto incidental da recolonização da Estepe dos Mamutes após o máximo glacial. Significativamente, antigas tradições das margens costeiras do Mar de Bering e de Chukchi, do Oceano Ártico e de ambientes terrestres adjacentes, como a Tradição Paleoártica Americana (~10.500-7.000 AP) e a Tradição de Microlâminas da Costa Noroeste (~10.500-< 7.000 AP) incluíam microlâminas em seu arsenal lítico. 

3.3 Clovis
As vias de penetração na América do Norte a partir da Beríngea têm sido exaustivamente discutidas. O modelo tradicional considera que grupos humanos caçadores de mamutes seguiram em direção sul através de um hipotético corredor entre as massas glaciais continentais Laurentiana e Cordilleriana, atingindo, por volta de 11.500, o “paraíso” livre de gelo na América do Norte, que o arqueólogo norte-americano James Adovasio jocosamente chamou de “Clovísia".
Da localidade de Clovis, no Novo México, tomaram o nome as ubíquas pontas de pedra finamente trabalhadas em ambas as faces, em forma de folha e com a canelura característica, associadas aos ossos de grande animais extintos (foto abaixo). Nos anos seguintes vários sítios Clovis foram encontrados em quase toda a América do Norte e também em partes da América Central, com a grande maioria das datações radiocarbônicas consistentemente apontando uma antigüidade entre 11.200 e 10.800 AP. Isso passou a impressão de que povos portando essa tecnologia teriam rapidamente se espalhado por todo o hemisfério. Numa espetacular “onda de avanço”, ou talvez melhor, numa blitzkrieg pré-histórica, teriam dizimado a megafauna que iam encontrando em sua rápida viagem, atingindo o extremo sul da América do Sul em apenas 1.000 ou 1500 anos. Esses povos Clovis seriam os precursores de todos os americanos17.



 3.4 Modelos Alternativos
Um modelo como o Clovis First, profundamente entrincheirado na arqueologia norte-americana por mais de setenta anos, não cederia lugar a outros paradigmas da noite para o dia. Contudo, novos sítios e novas datações forneceriam elementos decisivos para a sua derrocada. Hoje em dia, à hipótese Clovis contrapõem-se evidências de que a colonização do Novo Mundo ter-se-ia iniciado mais precocemente, há 15.000 ou mais, por forrageiros oportunistas que ainda não possuíam pontas lascadas à Clovis. Coletando uma ampla variedade de alimentos com instrumentos líticos simples, lascados em apenas um dos lados, essas pessoas teriam migrado para o sul através de diversos habitats, muito antes que os caçadores da megafauna tivessesm a chance de fazer o mesmo, se é que fizeram18.
De fato, vários sítios arqueológicos das Américas do Norte e do Sul pré-datam Clovis e o surgimento do corredor interglacial, colocando em xeque o modelo tradicional. Monte Verde, localizado no centro-sul do Chile, é um exemplo. Escavado por Dillehay e colegas, demonstrou a presença inequívoca de humanos na região por volta de 12.500 anos atrás. Outros sítios com datações pré-Clovis ou contemporâneas a Clovis incluem: Meadowcroft Rockshelter, na Pennsylvania (foto abaixo); Cactus Hill, na Virginia; Topper, na Carolina do Sul; Piedra Museo, na Argentina, e vários sítios do leste do Brasil. Clovis situa-se, dentro deste contexto, apenas como uma das várias culturas contemporâneas regionais, desenvolvidas logo após a migração original. O seu atrelamento à caça dos grandes herbívoros pleistocênicos contribuiu não só para a extinção destes mamíferos: Clovis, ela própria, também desapareceria, para sempre, do cenário cultural americano.


Se o modelo Clovis First perdeu campo nos últimos anos, a maior parte das evidências contra ele não formou um bloco homogêneo o bastante para compor um modelo novo a acabado. Como se verá, somente nos últimos anos é que se começou a esboçar um modelo que, se não está acabado, é totalmente novo.

3.5 Vias de Penetração
Juntamente com os modelos alternativos a Clovis começaram a ser propostos modelos alternativos à via de penetração terrestre. A idéía de uma ancestralidade européia direta, via Atlântico norte, para os primeiros americanos, muito em voga no final do século XIX, ressurgiu nos últimos anos, baseada na presumida semelhança entre as tecnologias Clovis e Solutreana, esta última do sudoeste da Europa19. Mas ao Solutreano faltam algumas características de Clovis, como as caneluras. As semelhanças, se é que existem, poderiam mais parcimoniosamente explicar-se por convergência.
Evidências acumuladas nos últimos anos têm fortalecido, contudo, a via de penetração costeira para as Américas através da costa noroeste. Estudos geológicos e paleoecológicos recentes indicam que vastas áreas ficaram livres de gelo na zona costeira da Colúmbia Britânica a partir de 16.000 AP 20,21. Isso teria permitido a livre passagem para migrantes providos de embarcações. Alguns sítios costeiros mostram que algumas culturas paleoíndias setentrionais incluíam adaptações marítimas.   Alan Cooper, de Oxford, observou que os ursos e os humanos compartilham as mesmas exigências ecológicas, e que os ursos pardos, de modo significativo, migraram da Sibéria, penetrando a América do Norte pela costa do Alaska. Além disso, evidências faunísticas da América do Sul situam as adaptações costeiras e às várzeas da floresta tropical seguramente entre as primeiras culturas paleoíndias regionais2. Infelizmente, as evidências arqueológicas que poderiam testar a via marítima de penetração são escassas, uma vez que a subida do nível do mar no final do Pleistoceno inundou grande parte da plataforma continental e, com ela, os sítios potenciais.

3.6 Processo de Povoamento
A penetração dos primeiros migrantes poderia ter-se dado de modo contínuo, semi-continuo ou discreto22 .Pequenos bandos podem ter povoado as Américas durante um longo período de tempo23 (Meltzer, 1989). Alguns fluxos migratórios podem ter tido sucesso e outros não. Alguns grupos podem ter sido varridos geneticamente por novos grupos migrantes. As populações atuais e os registros arqueológicos existentes, estudados ou não, talvez não representem todos os eventos migratórios já ocorridos, de modo que talvez nunca se vá saber exatamente quantos e quais grupos penetraram as Américas. De qualquer forma, parece certo que, ao contrário do que propõem modelos do tipo “onda de avanço” e “hipótese da supermatança” 17,24, as Américas não teriam sido completamente colonizadas em apenas cerca de 1000 anos, às custas da megafauna. Os migrantes teriam, sim, ocupado zonas ecológicas particulares, orientadas nas Américas sobretudo no sentido norte-sul. Zonas de transição entre diferentes biomas, ou ecótonos, teriam sido particularmente privilegiadas, de modo que zonas costeiras e vales fluviais seriam colonizados mais rapidamente25 .        
   
3.6.1 Eventos de Colonização do Ponto de Vista Tecnológico
Do ponto de vista tecnológico, parece ter havido dois grandes eventos de colonização nas Américas25. Do primeiro deles participaram os ancestrais dos complexos Clovis/Nenana, entre 13.500 e 11.500 AP. Estes grupos usavam projéteis do tipo atlatl (foto abaixo), em cuja extremidade colocavam lâminas de pedra bifaciais encaixadas em suportes tipo arpão, que por sua vez eram assentados sobre peças ósseas.  Este sistema tem suas origens ligadas a adaptações associadas à caça de mamíferos marinhos. Microlâminas e o arco-e-flecha eram-lhes desconhecidos. O atlatl foi a principal arma utilizada na América do Sul e nas zonas temperadas e meridionais da América do Norte até o período arcaico, embora seu uso tenha se prolongado até mais recentemente em algumas áreas. 


O segundo evento de colonização envolveu povos portando a Tradição Paleoártica Americana, cerca de 10.500 anos atrás, os quais introduziram o arco-e-flecha.

3.6.2 Eventos de Colonização do Ponto de Vista Lingüístico
A diversidade linguística das Américas é enorme. Cerca de 150 das cerca de 300 famílias lingüísticas existentes no mundo são encontradas no Novo Mundo26. Isso chega a ser surpreendente, tendo em vista a presumida existência de apenas um ponto de entrada (Beríngea) e uma área-fonte restrita (Sibéria setentrional).
O lingüista Joseph Greenberg propôs três amplos grupos que englobariam todas as línguas das Américas27. Todas as línguas da América do sul e a maior parte das línguas da América do Norte foram reunidas em uma família que ele chamou de “Ameríndia”. As duas outras famílias, mais restritas, seriam a Aleúta-Esquimó, englobando línguas do extremo norte do Canadá e algumas línguas Siberianas (com origem na América do Norte), e a Na-Dene, reunindo algumas línguas do noroeste do Canadá e sudoeste dos Estados Unidos. Suas conclusões, contudo, foram mal recebidas pela comunidade de lingüistas especializados em línguas americanas, que as viram como uma super-simplificação da realidade.
Nichols26 descreve afinidades estruturais (primeira pessoa n e segunda pessoa m, frases começando pelo verbo etc), as quais conferem uma continuidade lingüística para povos residentes ao longo das margens do Pacífico, envolvendo a costa americana, da Ásia e da Australásia, e que ela denominou “População das Margens do Pacífico”. A época, glotocronologicamente estimada, para a entrada desta população nas Américas é o final do último período glacial ou no início do Holoceno. Sabe-se que a População das Margens do Pacífico, no leste da Ásia, iniciou sua dispersão para a Melanésia nesta época, o que torna sua estimativa bastante aceitável. Estes movimentos, em ambos os hemisférios, parecem compor um quadro de expansão de uma população adaptada ao meio costeiro. Não há evidências lingüísticas de uma contribuição significativa da Ásia Central para a população lingüística das Américas. As principais conexões são com o Sudeste da Ásia e com a Melanésia.
Nichols entende que, após entrar na América do Norte, a População das Margens do Pacífico se dispersou por via costeira até atingir o sul da América do Sul. Para ela, grupos humanos somente ocuparam o interior da América do Norte após o término da última glaciação. Esses grupos teriam partido provavelmente das vizinhanças do Golfo do México, em incursões para o norte, e da costa oeste em direção à costa leste. A Cultura Clovis seria a pioneira nessa ocupação.

3.6.3 Eventos de Colonização do Ponto de Vista Genético
No início da década de 1990 estava se tornando cada vez mais claro que a aplicação da genética molecular no estudo das origens do homem nas Américas era mais complicada do que se imaginava. O DNA mitocondrial (mtDNA) da maior parte dos índios americanos pertence a quatro linhagens principais, ou haplogrupos28; Estes haplogrupos foram denominados A, B, C e D, e são, com exceção do haplogrupo B, encontrados na maior parte das populações atuais da Sibéria, mas não da Europa, da África ou da Austrália 29,30. Surpreendentemente, dada a taxa presumida de mutação do mtDNA, estima-se que esses haplogrupos possam ter começado a penetrar nas Américas tão cedo quanto 25.000 a 30.000 AP. Estudos semelhantes realizados com o cromossomo Y revelaram a existência de cinco haplogrupos nas populações americanas, com datas de penetração ainda mais precoces, de 40.000 a 50.000 AP!
Entretanto, por motivos que não cabe expor aqui, as coisas são mais complicadas do que isso, de forma que o povoamento do Novo Mundo permanece sem solução, do ponto de vista genético, no que concerne à profundidade temporal e ao número de eventos migratórios envolvidos. Dadas as evidências atuais, podem-se vislumbrar vários cenários: uma migração relativamente recente, contínua; uma única onda migratória começando cerca de 45.000 AP; ou muitos movimentos migratórios discretos, separados entre si por milênios. Em resumo: as evidências genéticas são ainda inconclusivas. 

3.6.4 Eventos de Colonização do Ponto de Vista Biológico
Peter Wilhelm Lund (1801-1880), cientista dinamarquês (foto abaixo), passou grande parte de sua vida estudando a fauna fóssil das cavernas da região cárstica de Lagoa Santa. Em 1842 Lund se refere aos crânios por ele encontrados na Lapa do Sumidouro como “conformes com os da raça americana”, acreditando então que “os povos que em tempos remotíssimos habitaram esta parte do Novo Mundo eram da mesma raça dos que no tempo da conquista ocupavam este território” 31 .Em 1844, porém, Lund reconhece que os crânios do Sumidouro apresentavam “uma maior estreiteza e baixeza da testa, assim como maior proeminência dos ossos faciais”, relativamente à raça “mongólica”. As observações de Lund não haviam, até bem pouco tempo, repercutido no meio antropológico americano, talvez por terem sido publicadas em português.



Na América do Norte, Thomas Newman e T. Dale Stewart observaram, na década de 1940, que um povo dolicocéfalo parecia ter precedido os indígenas modernos. Novamente, poucos deram ouvidos. Dessa vez a razão foram as idéias imperiosas e hegemônicas de Aleš Hrdlička, o influente antropólogo físico do Smithsonian Institution. Desde que anunciou32 que os primeiros americanos tinham sempre se parecido com os índios atuais, pouca gente se preocupou em verificar. De fato, as idéias de Hrdlička influenciaram gerações de antropólogos físicos, marcando o compasso para o paradigma que predominou até pelo menos o início da década de 1970, e talvez mesmo depois.
A falta de material humano para estudos foi um fator que contribuiu para este longo marasmo antropológico. Na América do Norte, apenas cinco ou seis esqueletos em estado relativamente bom existem, mesmo hoje em dia, e o material sul-americano, representado sobretudo pelas coleções lagossantenses de Lund e Harold Walter, por muito tempo aguardaram estudo mais aprofundado. Foi somente a partir do final da década de 1980 que estudos morfológicos mais pormenorizados começaram a ser realizados nas Américas, utilizando o recém-disponibilizado aparato computacional e estatístico.

3.7 Modelos propostos para a colonização das Américas
Christy Turner II dividiu as populações mundiais em dois grandes grupos, de acordo com as características de seus dentes33. O primeiro grupo, que ele chamou de Sinodonte, engloba os asíaticos do norte (chineses do norte, coreanos, japoneses, siberianos) e os índios atuais das Américas; o segundo grupo, que denominou sundadonte, engloba os asiáticos do sul, polinésios, e os Ainu de Hokkaido. As análises dentais de Turner juntaram-se às evidências genéticas da época e aos estudos lingüisticos de Greenberg para compor o que seria chamado de “Modelo das Três Migrações”. Segundo este modelo, populações sinodontes, mongolizadas, teriam chegado às Américas em três ondas migratórias, dando origem, respectivamente, aos grupos linguísticos Ameríndio, Na-Dene e Aleúta-Esquimó, conforme descritos por Greenberg.
As conclusões dos estudos craniométricos realizados a partir do final da década de 1980, contudo, começaram a desafiar este modelo34,35,36,37,38. As análises mostram uma clara semelhança biológica entre os Paleoíndios norte e sul-americanos, os quais, por sua vez, mostram maiores afinidades com populações australianas fósseis e modernas e com populações africanas modernas39,40,41 bem como com o material fóssil da caverna superior de Zhoukhoudian36.
 A partir daí ficou cada vez mais claro que o continente americano foi ocupado, no mínimo, por duas populações biologicamente distintas41,42. À primeira corresponderia uma morfologia não-mongolóide, mais generalizada (neurocrânio longo e estreito, face estreita e baixa, nariz e órbitas baixos e largos), associada aos paleoíndios norte e sul-americanos; o segundo componente biológico, representado por uma morfologia mongolizada, seria responsável pelas levas subsequentes de colonização.
É possível que a morfologia não-mongolóide tenha sido, em parte, absorvida pela morfologia mongolóide. Análises realizadas com o crânio de Kennewick (Foto abaixo), datado em cerca de 9.500 AP, apontaram para uma morfologia intermediária, sugerindo a possibilidade de que tenha havido uma miscigenação in situ dos extremos morfológicos provenientes da Ásia. É possível, ainda, que fluxos migratórios com graus variados de mongolização tenham penetrado o Novo Mundo desde o final do Pleistoceno38,43,44.



Embora muitos detalhes prodrômicos relativos à colonização das Américas não tenham sido dicutidos por seus autores, o “Modelo dos Dois Componentes Biológicos Principais”, como veio a ser chamado por Neves e colegas, sintetiza, de forma elegante, as conclusões das pesquisas que vêm sendo realizadas nas últimas décadas no campo da biologia dos primeiros americanos.

4- um modelo heurístico
De toda esta discussão vislumbra-se um quadro plausível em que populações australasiáticas deixaram a África e, numa progressão relativamente rápida, por via pericosteira tropical, chegaram ao sudeste da Ásia, ocupando não só a Sundaland e alcançando a Austrália em embarcações cerca de 60.000-40.000AP, mas também o sudeste da China continental, colonizando territórios mais ao norte depois de cerca de 18.000 AP. O crânio 101 da caverna superior de Zhoukhoudian (foto abaixo), com claras afinidades morfológicas com material Australo-Melanésico36 e datado entre 18.000 e 11.000 AP, poderia representar um marcador desta expansão australasiática, de morfologia craniana generalizada, como poderiam também representá-la, de forma relicta, as populações Jomon-Ainu do Japão, mais recentes. Sakiyama45 demonstrou a influência do proto-austronésico na formação da língua japonesa, argumentando em favor de uma migração de seus falantes para o norte, no período Jomon, da transição Pleistoceno-Holoceno.


É possível que esta expansão Australasiática tenha continuado por via costeira através das ilhas kurillas, Kamchatka e Beríngea meridional até alcançar o litoral da América do Norte. Essa colonização de ambientes periglaciais marítimos, algo marginais, poderia ter sido precipitada, pela grande expansão mongolóide após 18.000 AP, após a desintegração das Estepes dos Mamutes. Essa mesma expansão mongolóide levou, no sudeste da Ásia, à substituição ou absorção das populações australasiáticas, que foram impelidas em grande parte para as regiões insulares, e à formação dos Paleomongolóides. O esqueleto de Gua Gunung, na Malásia, datado em 10.200AP e portando uma morfologia não-especializada46, pode ser considerado um representante tardio de uma população australasiática na região. Os diversos povos negritos insulares atuais talvez representem um extremo fenotípico relicto dessas populações.
Uma rápida expansão pericosteira de grupos australasiáticos para o Novo Mundo deixaria poucas evidências arqueológicas, e de qualquer modo a maior parte dos sítios estaria hoje debaixo d’água devido à subida do nível do mar no Holoceno. É possível, contudo, supor que estes povos, antecedendo aos Neomongolóides, fossem portadores de uma tecnologia que não se caracterizasse pelas microlâminas, mas por projéteis do tipo atlatl e por armas ligadas a adaptações marinhas, envolvendo lâminas bifaciais. O complexo Nenana/Clovis seria descendente direto dessa expansão, que daria preferência, em um primeiro momento, a ecótonos (zonas de contato entre ecossistemas) pericosteiros para só mais tarde ocupar ambientes terrestres e especializar-se na exploração dos abundantes recursos megafaunísticos. Esta expansão fecharia o circuito de conformação das “População das Margens do Pacífico”, conforme definida por Nichols.

O segundo componente biológico a chegar ao Novo Mundo, seguindo os passos dos pioneiros Australasiáticos, seria constituído por povos neomongolizados em maior ou menor grau, talvez envolvendo a Tradição Paleoártica Americana, portadora de microlâminas e do arco-e-flecha. Esta expansão, possivelmente relacionada a eventos migratórios muito mais numerosos do que a primeira, e durando um período muito mais longo, a partir de cerca de 10.500 AP, teria levado à absorção, isolamento e/ou eliminação do primeiro componente biológico, talvez já alvo incipiente de forças evolutivas operando in situ, em diferentes contextos geográficos. Na América do Sul há evidências de uma grande substituição populacional por volta de 9.000-8.000 AP, quando a morfologia generalizada foi abruptamente substituída pela morfologia mongolóide clássica39,47,48. Por outro lado, Sutter49 sugeriu que a morfologia dentária também tenha sido alterada de um padrão sundadonte para um padrão sinodonte na costa do Chile e do Peru, no Holoceno médio. Regiões marginais geográfica e/ou ecologicamente teriam abrigado as últimas populações com esta morfologia. No leste do Brasil, a morfologia generalizada persiste nas populações lagossantenses até cerca de 8.000 AP, só havendo evidências da chegada de grupos mongolóides por volta de 2.000AP, após um longo hiato arqueológico no arcaico regional, quando a área parece ter sido abandonada. Outros exemplos de áreas-refúgio para populações remanescentes representando o primeiro componente biológico seriam a península da Baja Califórnia49 e vales isolados do Chile50 e da Patagônia.

 5- A Ocupação Pleistocênica da América do Sul
            Dada a presença humana na América do sul desde cerca de 12.500 AP51, deve-se presumir uma primeira colonização pelo menos alguns séculos ou milênios antes. Se os pioneiros, adaptados a condições costeiras, viajaram ao longo das costas do Atlântico e do Pacífico, é de se supor que tenham ocupado também os estuários e deltas dos principais sistemas fluviais, onde encontrariam maior estabilidade de recursos.  Entretanto, com a subida do nível do mar, ocorrida sobretudo entre 13.000 e 10.000 AP, muitos dos potenciais sítios de ocupação dessa época, principalmente na costa Atlântica, se perderam. Com a amenização do gradiente fluvial e consequente estabilização das calhas dos principais rios, após 10.000 AP, é possível que tenha havido uma interiorização do processo de colonização, subindo ou descendo os cursos d’água, sobretudo nas bacias do Orenoco e do Amazonas, onde a maior parte dos sistemas fluviais tem uma orientação leste-oeste.
  A maior parte dos sítios Pleistocênicos sul-americanos conhecidos está associada a ambientes lacustres, fluviais ou costeiros51. As populações dessa época parecem ter atingido baixa densidade, compondo-se de grupos de caçadores-coletores especializados nos recursos lacustres, ribeirinhos e marinhos. Entretanto, por volta de 11.000AP detecta-se um aumento dos movimentos populacionais, sugerido pela difusão das pontas de tipo rabo-de-peixe e suas variantes do cone sul. Entre 10.000 e 7.000 AP, a dieta humana ao longo da costa do Pacífico e em outras partes da América do Sul sofreu uma significativa alteração, tornando-se menos especializada ao incorporar e domesticar plantas e animais antes sub-utilizados, além de se valer de novas tecnologias líticas.
De uma forma geral, os desenvolvimentos culturais na América do Sul foram bastante particulares relativamente aos observados na América do Norte e em outras partes do mundo. Aqui observa-se uma precoce e contínua tendência à perda de uniformidade e ao estabelecimento de distintas tradições regionais, com a maior parte dos grupos compondo sistemas proto-Arcaicos complexos. Observam-se, desde muito cedo, padrões sociais e econômicos característicos: economias forrageiras generalizadas, inflexões demográficas, territorialidade frouxa, diferenciação social, complexidade cultural, práticas rituais e diversificação das tipologias líticas.
O final do Pleistoceno na América do Sul foi, assim, marcadamente diferente do verificado na América do Norte. Ao contrário do que se observa na América do Norte, nota-se na América do Sul a ausência de um estilo lítico quase universal, como Clovis. Não se observam, tampouco, sinais de uma seqüência estratigraficamente comprovada de evolução tecnológica. Por outro lado, alguns tipos como as bolas de pedra e as úbiquas tecnologias unifaciais são uma inovação do sul: parecem representar rápidas mudanças culturais, provavelmente resultantes de um processo de colonização bastante rápido a partir de 11.000-10.000AP, assim como adaptações locais altamente eficientes, evidenciando o desenvolvimento de inúmeras culturas regionais ocupando os mais diferentes ecossistemas do continente.

 5.1 Um caso particular: a ocupação das Florestas Tropicais
Durante anos se admitiu que a maior parte da floresta amazônica tivesse cedido lugar às savanas, recuando para alguma áreas de refúgio nos períodos glaciais do Pleistoceno52.  Hoje se sugere, contudo, que grandes áreas da Amazônia central tenham permanecido florestadas, e que a fragmentação da floresta, pelo menos na extensão sugerida por Ab’ Saber, não tenha existido53,54,55. Muitas são as evidências arqueológicas de ocupação abrangendo o período ceramista, na Amazônia; sinais de ocupação paleoíndia, contudo, são raros.
Raros, mas de modo algum ausentes: escavações realizadas na Caverna da Pedra Pintada, em Monte Alegre AM (foto abaixo), próximo ao Rio Amazonas, evidenciaram a ocupação paleoíndia nas terras baixas da Amazônia2. Nos estratos do período, datados entre 11.200 e 10.500 AP, foram encontradas pontas bifaciais triangulares associadas a restos de sementes de espécies de árvores e palmeiras de ambientes de floresta tropical. Estes grupos paleoíndios também praticavam pinturas parietais. Sua subsistência era baseada no forrageio de longo espectro de recursos da floresta tropical. Depois de 10.500AP a caverna foi abandonada, voltando a ser ocupada entre 7500 e 6625AP por povos da cultura Paituna, que mantinham uma economia de amplo espectro, marcada pela exploração da fauna ribeirinha. Esta cultura é responsável pelas cerâmicas mais antigas da América do Sul.


A idéia de que existiriam, na floresta tropical amazônica, fatores ambientais limitantes ao crescimento demográfico e à complexidade social tem longa tradição na Antropologia da América Latina. Lathrap56, acreditando que os pioneiros sul-americanos tivessem sua economia voltada para a caça da megafauna, sustenta que as florestas, e sobretudo o seu interfluvio, pobres em caça, foram colonizadas tardiamente. Headland e Bailey vão mais além57, dizendo que as florestas tropicais de todo o planeta, e não somente as sul-americanas, são ambientes em que os alimentos, sobretudo os carboidratos e as gorduras, são escassos, dispersos no tempo e no espaço, e que, portanto, os povos forrageiros desses ambientes só puderam se estabelecer aí depois da introdução de novas espécies de plantas e do manejo de outras, ou ainda pela troca de produtos com povos agricultores dos limites das florestas. Para Lathrap, Headland e Bailey, os caçadores-coletores das florestas não seriam remanescentes de populações paleolíticas, vivendo de forma inalterada desde tempos imemoriais, mas os descendentes degradados de povos que já mantiveram uma forma avançada de cultura da floresta tropical.
Mas estas idéias poderiam estar por demais permeadas pelo funcionalismo ecológico. Politis58 acredita que a trajetória histórica e evolutiva dos forrageiros da floresta tropical, caracterizada sobremodo pela alta mobilidade e pela exploração seletiva dos recursos animais e vegetais, teve um grande efeito sobre a estrutura das florestas. A horticultura hoje praticada não seria indispensável à manutenção de níveis nutricionais adequados, mas seria tão-somente o resultado histórico de um modo de vida em que a cosmologia, e não o ambiente, teria o assento principal.
A construção da paisagem envolveria, assim, uma história co-evolutiva, mutualística, entre o homem e a floresta, que remontaria à transição Pleistoceno/Holoceno. Ao longo do tempo, a combinação de ações sutis e prolongadas na paisagem florestal fariam com que a selva perdesse sua uniformidade e que se fossem criando locais de concentração de recursos úteis.
Seria uma ilusão, portanto, imaginar que os grupos móveis contemporâneos sejam remanescentes de antigas sociedades horticultoras, sedentárias, e obrigados por fatores ambientais a adotar um modo de vida móvel59.Essa “regressão” poderia até acontecer, mas os seus motivos não seriam de ordem meramente econômica ou ecológica: fatores da esfera da economia política seriam os verdadeiros determinantes.

 6- Palavras finais
            Ainda há muito que avançar a arqueologia e, sobretudo, a antropologia física nas Américas. Heuristicamente falando, não se devem descartar hipóteses que ainda careçam de comprovação em contrário (a ausência de evidência não significa, necessariamente, evidência de ausência). É possível, portanto, que um futuro próximo venha a abrir as cortinas do passado para revelações surpreendentes relativas ao processo de povoamento das Américas. Talvez a sua profundidade cronológica atinja épocas mais recuadas; talvez outras vias de penetração ou outros componentes biológicos sejam detectados, alterando para sempre as noções correntes e inaugurando novos paradigmas. A resposta final, a verdade iluminada, não existem, mas a ciência caminha sempre em sua direção. Um elo fundamental dessa história pode estar logo ali, no canto de alguma caverna, esperando que a chama (de um espeleólogo?) o desvende.
A América do Sul foi o último continente a ser povoado pelo homem. Era o verdadeiro fim do mundo. Não fosse a união terrestre das duas Américas, completada há 2.8 milhões de anos, e o grande intercâmbio faunístico que se sucedeu, do qual o homem tomou parte eloqüente, ainda que tardia, as coisas poderiam ter tomado rumo diferente. É possível que Caminha, em sua carta, descrevesse não os 18 ou 20 índios “tão rijos e nédios” que viu na praia, mas estranhas bestas remanescentes de tempos passados, para grande espanto de seus patrícios. E a verdadeira Ilha de Vera Cruz, o grande continente-ilha austral, seria povoado pelo homem anatomicamente moderno pela primeira vez, a partir do ano da graça de 1500.
Infelizmente, nos alvores do século XVI, os grandes mamíferos pleistocênicos haviam deixado o palco da vida. Mas os últimos remanescentes do primeiro componente biológico, dos primeiros povoadores, ainda viviam, quiçá alhures, mas certamente nos rincões da Baja Califórnia, onde o derradeiro deles expirou, pouco mais de um século depois49.
Aqueles guerreiros emplumados que Caminha viu de seu batel eram recém-chegados àquelas praias. As pregas epicânticas em seus olhos denunciavam sua distante origem neomongolóide; e o tupi que de seus lábios se ouvia contava uma longa história de sucesso biológico cujas origens se perdia nos rincões do Velho Mundo.



Agradecimentos: ao Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas (GBPE), onde adquiri o gosto por essa história; a Walter Neves,do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos da Universidade de São Paulo, que me permitiu vislumbrar mais de perto um pouco dela. E aos colegas de escavações em Lagoa Santa, com quem compartilhei o verdadeiro espírito da descoberta científica.







 

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